É uma
noite fria, em que densas nuvens choram sobre corpos de vivos e mortos. Diante
do castelo, um espetáculo de sangue e morte que somente seu amado é capaz de
proporcionar. O som de carroças e cavalos, disparos de mosquetes e de bestas,
gritos de homens e animais em pânico... Ela assiste a tudo isso sem muita
esperança, algo em seu coração, dizendo que é o fim. Adam partiu para o campo
de batalha, determinado a exterminar cada um daqueles muitos homens que ameaçam
sua casa.
Na defesa
do castelo, apenas uma dúzia de homens. Gente da própria região, muitos na
verdade são maridos ou filhos das empregadas, que o casal contratou há poucos
anos. Foi um duro golpe para Marie ver que dentre os doze guardas, cinco fogem com
seus parentes (e alguns espólios) ao ver a aproximação dos inimigos, e os
outros sete resolvem mudar de lado quando ouvem que seus patrões são “uma bruxa
e um vampiro”. Bruxa, a desculpa
perfeita para que aqueles homens “leais e obedientes” de antes, se achem no
direito não só de traí-la, mas também violá-la, para só depois entregá-la aos
invasores. Infelizmente para eles, Marie Winnicott tem uma espada, e sabe
usá-la muito bem.
Passados
alguns minutos, é com pesar que ela puxa a espada do peito do último dos traidores,
não esperava que o respeito e generosidade dela para com eles valesse tão
pouco. Sete corpos espalhados pelas escadas antes mesmo que os inimigos entrem.
Na verdade oito, pois uma das empregadas não reagiu muito bem ao encontrar o
corpo do marido pelo caminho, e decidiu que seria ela mesma a vingar seu amor. Não durou
muito. Quando os inimigos chegaram,
não houve resistência alguma para além de uma jovem surpreendentemente bela,
com uma espada em mãos e um coração determinado.
Ela
sabe que Adam faz o impossível lá fora, mas as vezes, mesmo o impossível é
insuficiente.
— Vejam, a bruxa está matando seus próprios
servos! — Grita um jovem ruivo e forte, para o irmão de tocha e espada em mãos.
Gêmeos idênticos aqueles que trezentos anos depois tentariam violentá-la.
Marie
observa aquela dupla que sobe as escadas, com olhos fanáticos, famintos por
saciar seus instintos que pedem por sangue.
Olhe para eles, Adam, e diga-me se não
são mais monstruosos que você; pensa ela.
Com a
beleza artística e a precisão de uma bailarina, ela desvia da lâmina do
primeiro, saltando sobre a espada do segundo e terminando o passo com duas
estocadas rápidas que ceifam a vida de ambos os irmãos. Seus corpos rolam pelas
escadas, em uma sequência capaz de perturbar os ânimos daqueles que invadem e
incendeiam seu lar.
— Sou
uma só, rapazes, esperem sua vez de dançar, sim? — Diz ela, enquanto assume uma
postura de esgrimista experiente.
Os
inimigos vem, um após outro, com tochas, espadas, bestas e até mesmo armas de
fogo. E ela os enfrenta, sem regras, sem auxílio, usando apenas sua habilidade
superior, astúcia e domínio do terreno para diminuir a desvantagem. Cada um
deles tomba em meio àquela dança mortal, mas não sem deixar sua marca. Corte
após corte, seu corpo vai perdendo as forças, tornando mais e mais difícil
reagir a tempo. Adam é um vampiro, seu corpo morto é capaz de suportar e se
curar de ferimentos capazes de matar a qualquer mortal, mas ela não. Sua
humanidade, elemento que tanto fascina seu amado, a limita a cada novo
ferimento.
Quando
enfim eles deixam de subir, ela tem um corte profundo na altura do ventre, de
onde o sangue jorra abundante. Seu corpo já fraco cai sobre a cama, buscando o
descanso eterno...desejo ao qual ela não cede.
Não ainda, não sem vê-lo uma última vez, não sem olhar para os olhos que sobre
ela exercem uma força de atração para a qual não encontra explicação. E é assim,
cercada por corpos e armas de inimigos, em meio ao fogo que consome seu
castelo, com um ferimento mortal, após um tempo que parecera eterno, que ela o
reencontra.
Um
último encontro e uma última noite juntos.
Ao
menos até agora.
[...]
Adam
olha para sua amada com espanto e admiração. Marie, sua Marie, de volta. De
algum modo que desafia a razão, sua alma tomou o controle do corpo da Claire,
sua encarnação atual. Ele não se importa realmente com explicações, não quando
pode tocá-la e sentir seus lábios, seu cheiro, sua voz e seu amor. E é isso que
faz.
Ele a
abraça com força, ignorando os inimigos e todo o inferno que os circunda. Ela
se deixa abraçar, seus lábios retribuindo com o mesmo fervor e paixão os
sentimentos que encontra nele. Por um momento, um efêmero e singelo momento,
eles são um novamente.
— ...eu
ouvi sua voz me chamando. Eu voltei, voltei por você. — Ele diz, olhos nos
olhos, enquanto os lábios se afastam.
Ela
sorri, o conhecido sorriso que o ganha por completo, e diz:
— Eu
sei, meu amor. Eu sinto você, através dela...através da minha nova eu. Eu tenho
amado você através do amor dela, desse turbilhão de sentimentos que você
desperta no coração da Claire, desse...
O
momento é interrompido por um disparo em direção a cabeça da Marie, que Adam
habilmente evita, a puxando mais para si. O tiro veio da arma da vampira
Kellen, que os encara com ar de tédio.
— Me
desculpem estragar seu momento, mas estamos no meio de algo importante, aqui. —
Ela diz.
O
casal sorri, enquanto examina a nova situação. Tom está de joelhos, o ferimento
na testa já parcialmente cicatrizado. René se alimenta de pacotes de sangue embalado,
trazidos pela vampira. Como resultado, seu braço decepado está regenerado, e
alguns dos muitos ferimentos estão em melhor estado. Kellen se mantêm a frente
do Padre, ainda muito ferido, que mantêm a concentração em reunir todo sangue
derramado não só ali, mas por toda a igreja e arredores, rumo ao túmulo
profano. Sangue do Andy, do Malcon, da matilha, do Paul, do Roger e de outros.
—
Essas armas modernas são bem rápidas, tomarei mais cuidado. — Marie diz para
Adam, enquanto gira a adaga que retirou da nuca do vampiro antes caído.
— Compreendo,
quando voltei, levei alguns tiros também. — Adam responde, sentindo-se
revigorado pela presença dela.
— Ela
precisa morrer, não há muito tempo. — Diz o Padre, tenso. — O Grande Mestre precisa
da vida da virgem para retornar, façam o que tem que ser feito.
[...]
O
Golem corta a cidade em seu carro negro como a noite e blindado como sua
armadura. No banco de trás, uma garota ao mesmo tempo feliz por ter sido
resgatada, e frustrada por não ter sido seu irmão, a Emma ou mesmo o Andy a
fazê-lo. Paul dirige o mais rápido que pode, focado na estrada deserta, tentando
não pensar no que aconteceu minutos atrás.
—
Então é ela, Paul? A súcubo que te enfeitiçou, que te transformou nisso? —
Pergunta uma voz que não ouvia há algum tempo, a voz da madre Pietra, parcialmente
queimada, sentada ao seu lado.
Paul
segura mais firme no volante, tentando ignorar a figura que o assombra.
— O
quão mais fundo deseja afundar, não vê no que está se tornando? Feriu e matou
inocentes em nome de uma vampira que nem sequer o reconhece, um demônio incapaz
de amá-lo! Conduziu um bom homem direto para a morte. Está servindo de capacho
não só para bebedores de sangue, mas agora, até para lobisomens, os cães do
inferno. — Ela prossegue, seus olhos ternos, sua mão sobre a dele. — Não sente
o peso do fardo, não sente as correntes que o puxam para o fundo?
O carro para bruscamente, Mandy sendo jogada
contra o banco da frente.
— Ô
maluco, que deu em você!? — A garota pergunta, enquanto esfrega um olho inchado
pela pancada contra o banco. — Não é por que você vai me deixar no hospital,
que tem que me quebrar toda primeiro.
— ...
não sou capacho de ninguém. — Ele sussurra, para uma mulher morta.
—
...hein, fala pra fora, cara! — Brinca a adolescente, se aproximando do
mascarado.
Ele
tira a máscara, aos olhos de uma garota surpresa.
—
Isso, Paul, faça o que sabe que deve fazer. — Olhando para a garota. — Extermine os monstros!
— Eu
faço o que eu quero. — Ele diz, olhando então para a Mandy. — E você não vai
para hospital algum.
Dito
isso, um golpe rápido com as costas das mãos leva a garota a inconsciência.
—
Você fala demais, freira. Devia era me agradecer, ou não se lembra para quem eu liguei antes de invadir a
igreja?
A
madre sorri ao ouvir isso, sua aparência novamente restaurada, como antes do
tiro e do fogo.
— Foi
sábio de sua parte fazer isso. Um primeiro passo rumo à sua redenção. — Ela
diz, desaparecendo em seguida.
—
...só continue, Paul. — Ele diz para si mesmo, enquanto acelera o carro, e
pensa se ainda a verá de novo. Não a madre...mas Kellen. — ... apenas continue.
[...]
Andy sai
do templo.
Uma
vez lá, frustrado por não encontrar ninguém, segue o cheiro que o leva até o
corpo de Roger, morto com um tiro na cabeça. Depois, se dá conta que o odor
continua até o lado de fora dos muros. Um uivo se faz ouvir, cheio de ódio e
dor. É o Malcon, ele sabe. O grande lobo branco corre então até os portões que
foram arrombados pelo caminhão que ele usou para invadir, focado em não perder
o rastro, pensando apenas no cheiro e no sorriso daquela garota marrenta e adorável. A irmã do sujeito
que o ensinou a se controlar, que lhe ofereceu um lar.
Ao
passar pelo portão, percebe a presença de dois furgões pretos, parados à
frente. Diante deles, o corpo ensanguentado de um jovem nu e cravejado de
tiros. Rickon, ele percebe. Então se dá conta dos outros cheiros que buscava
ignorar... cheiros de homens que entraram nesse terreno maldito. Mas isso não
importa; só ela importa. Andy se
lembra da noite em que ela brincou com ele, em que ensinou que queria algo mais
quando apenas queria rir da sua cara, assumindo a forma de um pequena loba.
— Ela consegue, todos da matilha conseguiam...
até você, viadinho. — Ele diz,
olhando para os olhos arregalados do jovem. — Então eu também consigo.
O
grande lobo branco fecha os olhos, se concentrando e forçando seu corpo a
mudar. E em um momento ele assume a forma de um lobo de porte comum, seu pelo
ainda sujo de sangue e seus olhos vermelhos. Ele sente o rastro do carro, com o
cheiro da Mandy e do “Golem” nele, agora já longe da sua vista.
Aguenta firme, Chapeuzinho; ele pensa,
incapaz de falar, o lobo mau já tá chegando.
Ele
segue o rastro, cruzando um longo caminho, cheio de incertezas e medos. Rumo a
Mandy. Rumo ao Golem.
[...]
René, Tom e Kellen concentram seus ataques em Marie. René aposta no ataque direto, enquanto Tom se mescla as sombras para
realizar ataques inesperados e Kellen mantêm a mira, buscando desferir um tiro fatal,
ou apenas atrapalhar os adversários. Adam se concentra em proteger a amada das
investidas de René, enquanto ela se foca em escapar e reagir aos ataques dos
outros dois.
Marie
está ofegante, protegida atrás de uma pilastra para escapar dos tiros, e tentando
perceber de onde virá o próximo ataque do pequeno vampiro. Ele que furtivamente
move-se pelo teto, silencioso como um predador; letal como um assassino
experiente. Marie tem um problema, a parca iluminação a base de velas, todas distantes de onde ela se encontra, tornando o terreno perfeito para predadores
noturnos. Quando ele a nota distraída, cai sobre ela de braços abertos, como se
a morte a abraçasse. Marie reage no último instante, seus ótimos reflexos a salvando de uma lâmina que passa a meio centímetro de seu pescoço.
— Você
é muito boa pra uma humana, Clarzinha. — Ele diz, desviando da estocada na nuca
e do chute que a sucede. — Mas seu destino já tá traçado.
— É
mesmo, diabinho? — Ela pergunta, exibindo um sorriso sapeca.
Dito
isso, a jovem estende a palma da mão esquerda na direção dele, em seguida
fazendo um corte nela com a adaga que pegou do garoto. Ele contempla surpreso
enquanto Marie sussurra palavras que ele não entende, seguidas de um brilho
prateado que parece aumentar de intensidade em ritmo acelerado. Um medo
instintivo toma conta do menino enquanto salta para longe dela, porém não antes
do brilho prateado queimar seus olhos.
Ele
grita de dor, enquanto rola pelo chão, deixando a adaga cair ao levar as mãos
aos olhos.
— A maldita
me cegou! A humana é uma bruxa! — Ele berra.
Adam
gargalha, enquanto bloqueia outra série de ataques de René, que dá tudo de si
nesse novo round da disputa.
—
Oras, não a escolhi como esposa só pelo rosto bonito. A Bruxa de Prata, era assim que a chamavam em nossa
época. — Adam desce em forma de morcego sobre o francês, acertando os dois pés
no tórax do inimigo, afundando parte do piso com o impacto. — Devia ter feito
melhor o dever de casa, Padre.
Marie desvia
de uma série de tiros enquanto rola até a adaga caída, depois lançando sua outra
lâmina contra a pistola da vampira atacante. Kellen se prepara para desviar, mas
o brilho prateado se repete, dessa vez originado da adaga arremessada. Ela
protege os olhos enquanto desvia para baixo, só no último momento percebendo a
aproximação da adversária.
—
Perdão, mas eu e a Claire estamos bem furiosas com mulheres que tentam nos
separar do Adam. — Ela diz, enquanto segura o pescoço da vampira com a mão
ensanguentada, fazendo a mesma gritar de dor e deixar cair a arma. Arma que é
em seguida destruída pela jovem humana.
Tom
se afasta dos adversários, guiando-se por seus outros sentidos, impedido de ver
qualquer coisa. René se ergue com dificuldade, usando a espada de apoio,
enquanto Kellen cai de joelhos, levando a mão ao pescoço destroçado, se
esforçando para reter o sangue. O casal se olha com orgulho e afeto, e depois
olham para o Padre. E tem uma infeliz
surpresa.
Ele
está de pé, ainda ferido, mas trazendo uma garota pelo braço. É Elizabeth, a
ruiva que ficou fascinada por Adam, a ponto de trair seus colegas e jurar sua
vida a ele. Ela se manteve a distância da luta, observando tudo das sombras,
aguardando pela vitória de seu novo ídolo. Até agora.
— ...
não, qual é, Padre? — Ela protesta, tentando fazer força, mas mesmo que o líder
vampiro esteja enfraquecido, sua força ainda é bem maior. — Eu tenho dezoito,
acha mesmo que ainda sou virgem, cara?
— Há
um modo simples de saber. — Ele fala, puxando seu pulso e sugando dele.
Após
sentir o gosto, ele fecha os olhos e lambe os lábios, dizendo:
— O
sangue não mente. Ainda é pura, ao menos no corpo.
— ...
não acredito que me guardei tanto pra isso. — Então olha para o Adam, frustrada.
— Eu estava esperando por um cara como você, Adam Tepes.
É com
um sorriso sem graça da parte dele e uma sobrancelha arqueada da parte dela,
que Adam e Marie partem para cima do sacerdote, prontos para colocar um ponto
final nessa cerimônia. Mas inutilmente. René bloqueia a passagem do adversário,
todo o sangue que lhe resta sendo usado para fortalecer os braços que prendem o
filho do Drácula.
— Pardonnez-moi, mon ami. — Ele diz, seus
músculos com força sobre-humana. — Notre
combat est pas terminée.
Marie por sua vez tem seu avanço detido por adagas arremessadas pelo pequeno Tom.
Mesmo cego ele é muito bom com elas, o suficiente para que ela tivesse que
desviar de uma na altura do ombro e bloqueasse uma segunda, com sua própria
adaga. Kellen também dispara, embora não consiga se pôr de pé, ainda tem
reflexos para sacar uma arma escondida e forçar a inimiga a recuar.
Enquanto
o casal se frustra por não conseguir impedir o fanático, e seus comparsas se
alegram por cumprir sua missão, algo de inesperado acontece. Ouve-se um
estrondo, e metade da cabeça do padre é estourada com um tiro. Ele cai de lado,
junto com sua cimitarra, deixando uma jovem ruiva assustada, coberta de sangue
e muito feliz por não ter morrido. Kellen faz uma expressão de puro horror ao
contemplar a cena, enquanto o restante apenas fica sem reação. O sangue deixa
de fluir para o túmulo profano, interrompendo os planos da Irmandade de Sangue.
O
tiro vem de um homem de capuz, com uma espingarda calibre doze em mãos, máscara
de gás e um enorme crucifixo prateado. Outros onze homens como ele surgem no
local, cinco ao seu lado, e outros seis vindos das saídas usadas pelos vampiros
da seita. Todos com escudos de tropa de choque, que cobrem todo corpo e dão
visão para o alvo. Enquanto se agrupam, o atirador avança lentamente enquanto
diz:
— Então
essa é a famosa “Irmandade de Sangue”? A seita que recruta adolescentes
prometendo vida eterna? Os sanguessugas que deturpam a palavra de Deus, fazendo
uma paródia bizarra de sua santa igreja? — Ele para, olhando para o Padre caído.
— Confesso que esperava mais.
O
clima é tenso, com cada um dos vampiros presentes se afastando uns dos outros,
uma vez que sua luta parece ter perdido o sentido. Todos atentos, sabendo que
qualquer movimento brusco pode iniciar algo perigoso.
— Nos
pegou em um mau dia. — Diz Kellen, encarando o sujeito. — Parece que
organizamos uma festa para meia dúzia de crianças, só que elas não param de
chegar. E cada uma traz um amiguinho novo.
—
Notei os corpos, parece que deram um uma festa dos infernos. — Ele responde.
— Então
é verdade que a Ordem do Dragão continua atuando nesse país. — Fala Adam, com voz
imponente. — Diga seu nome, humano!
— Aqui
não há lugar para nomes ou egos, sou apenas um servo de Deus. Mas não pense que
pode me dar ordens, Adam Tepes, filho do demônio. É o fim para vocês, criaturas
do inferno. — O atirador diz, enquanto faz o gesto de uma cruz. — A justiça divina chegou.
O
anúncio é claro, e todos ali sentem que é hora de agir. Os onze homens atacam
de modo coordenado e tático, com escudos posicionados para se proteger,
enquanto se revezam em avançar, disparar, lançar bombas incendiárias ou de
fumaça. Em instantes, tudo vira o inferno. Adam e René são os principais alvos,
desviando de balas de prata enquanto tentam proteger quem lhes é precioso. René
recebe uma saraivada de tiros para chegar ao corpo do Padre, até que Adam o
perde em meio a fumaça que se ergue. Tom desaparece nas sombras, e Kellen se joga
para trás da coluna mais próxima, enquanto Marie faz o mesmo, só que do lado oposto.
Adam força
passagem até sua amada, recebendo no processo tiros de fuzil na altura do
ombro. Ele rilha os dentes, mas suporta a dor, parando ao lado dela. O cenário
logo exibe o cheiro de fumaça, com focos de incêndio em diversas áreas. Os sons
dos tiros são ensurdecedores, o calor do fogo aumentando e dificultando o
combate para seres como ele.
— Marie, você foi... — Ele pergunta com temor, lembrando daquela fatídica noite há trezentos anos atrás.
— Uma
dessas coisas me acertou de raspão, nada além disso. — Ela responde, com a
perna sangrando.
A
conversa é interrompida por uma bomba incendiária, que explode próximo a eles.
Adam a envolve em seus braços e salta para longe do foco da explosão. O ato
cobra seu preço, e o vampiro é tomado por queimaduras graves espalhadas por
suas costas e braços. Marie sente o enorme calor que queima as pontas de seus
cabelos e aquece seu corpo.
—
...Adam?
Ela
termina sob um Adam gravemente ferido, sem chance de reagir a investida dos
dois atiradores que se aproximam. Ela é ágil, derrubando o primeiro com um
chute rasteiro e encerrando a luta com uma adaga que encrava no pescoço do
sujeito, antes mesmo que ele tivesse tempo de reagir. Quando pensa em atacar o
segundo, o vê caindo diante de si, o pescoço sendo sugado por uma criança saída
das sombras.
— Não
morre agora, Clairzinha. — Tom diz, parando por um momento de beber. — Temos
que nos encontrar de novo, quando isso acabar.
Marie sorri, diante da ajuda inesperada da criança que ela hesitou em matar.
— Marie... — Adam se ergue com dificuldade, chamando pela amada.
Ela o
abraça, o ajudando a se pôr de pé. Seus olhos se encontram, e eles sentem que a
pesar de tudo isso, da dor, do risco e do medo, estarem juntos é uma alegria
que supera qualquer outro sentimento. Infelizmente para o casal, os
inquisidores são muito bem treinados, e eficientes. Através da fumaça que os
encobre e dos óculos com visão infravermelha, três atiradores abrem fogo contra
eles. Marie presente o perigo e se abaixa, com Adam saltando sobre ela enquanto
recebem uma saraivada de tiros. Ele sente a dor das várias balas prateadas que atravessam
seu corpo. Sente o sangue escorrendo e encharcando sua roupa. Sente o medo por
ela.
—
Quem é ela, demônio? E por que ela é importante para você? — Pergunta o líder
inquisidor, após cessarem os tiros.
Adam
tem ferimentos por toda parte, buracos de bala nas costas, ombros, braços e
pernas, e sangue escorrendo por eles. A dor dos tiros, do fogo e da prata o
levando ao limite físico. Ele abre os olhos, encarando o rosto angelical
daquela por quem daria todas as vidas que tivesse.
—
Adam... eu... — Marie sussurra, sangue nos lábios. A dor dos tiros lhe roubando
a fala, e a consciência.
— ...
ela é minha esposa. — Ele encara o sujeito, seu olhar aterrorizante. — A esposa do demônio!
Com a
aura terrível emanando, a ponto de cada humano e vampiro senti-la, ele invoca
uma centena de morcegos, capazes de protege-lo e deter as armas de seus
adversários, que são jogados para longe. Ele a toma nos braços enquanto ouve o
som de gritos e tiros, sente o calor do fogo e da fumaça. Enquanto sente o medo
de viver tudo de novo, de perder Marie novamente. De perder a Claire.
Então,
se mesclando ao enxame de morcegos ele voa, carregando o corpo de sua amada, indiferente
ao túmulo de Vlad Tepes III, indiferente ao corpo de um Padre que pode vir a se
levantar novamente, indiferente aos vampiros que servem a seita, indiferente
aos homens que tentam exterminá-los. Tudo que importa é ela, e ele não irá
perde-la novamente.
Ele
alcança o céu de uma noite fria, e que começa lentamente a derramar sua chuva
sobre eles.
[...]
— É
pra mim? — Ela pergunta, irônica. — Eu até que prefiro os ratinhos, mas ela
quebra um galho.
Paul
está com a armadura, mas sem a máscara. Logo trata de prendê-la em correntes de
prata ainda mais grossas, reservadas para momentos como esse. O professor
ignora as zombarias da vampira, que percebe que ele está de pior humor que de
costume.
— Que
foi, Paulzinho... deu em cima da menina e ela te deu o fora, foi? Então cansou
da sua obsessão pela sua ex vampira, e agora tá indo atrás de lobinhas
adolescentes? — Ela diz isso com prazer, tentando afetá-lo de alguma forma, da
menor que seja. — É cada tara estranha.
Paul
a encara com ódio, ao mesmo tempo surpreso por ela saber sobre os lobisomens da
cidade, até mesmo suas identidades, e não ter dito nada disso durante as
sessões de interrogatório.
—
Melhor não mexer comigo hoje, mulher, ou vai descobrir o quanto posso ser
criativo. — Ele diz.
Ela
se cala, sabe quando entra em terreno perigoso, e não está disposta a sofrer
por bobagens.
—
Espero que trate bem sua colega de canil. — Dito isso, ele sobe, trancando a
porta que leva ao sinistro porão.
Paul
está exausto, física e mentalmente. Ele tira a roupagem e cuida dos ferimentos,
coisa que teve que aprender para sobreviver nesse tipo de vida sem levantar
suspeitas demais. Em seu quarto, ele olha para o retrato de casal que mantém ao
lado da cama. Aquilo é o suficiente para despertar todo o vendaval de emoções
que vivenciou hoje. Lembra do rosto dela, e das palavras do Roger antes de
morrer. Ele lamentava por falhar.
Velho idiota, quem falhou com você fui
eu, pensa ele, com amargura.
Paul
pega uma garrafa da sua melhor bebida, única aliada nesse momento. E bebe. Bebe
para esquecer da dor que se espalha por todo seu corpo. Bebe para esquecer da
dor em seu coração. Bebe para esquecer que é um homem amaldiçoado, assombrado
por fantasmas que somente aguardam por sua morte e danação eterna.
[...]
O
lobo corre.
Corre
como nenhum lobo deveria ser capaz de correr. Cortando a cidade, sem sequer dar
tempo para as poucas pessoas que o notam perceberem que não se trata de um cão
fugitivo. Andy sempre se orgulhou de ter fôlego de atleta, e ele testa isso ao
máximo nessa noite. O lobo corre, sem perder o cheiro, parando apenas quando a
exaustão se torna insuportável. Por sorte, enquanto avança pela deserta estrada
que leva a Bleak Hill, se depara com uma caminhonete indo na mesma direção.
A coisa
é rápida, mas ele é mais. Em um salto, ele se joga sobre a caçamba cheia de
tralhas, se deixando enfim descansar sem perder o foco. O tempo passa
lentamente sobre a velha caminhonete, enquanto ele observa a lua o vigiando lá
de cima. Vendo o que aquele ladrãozinho de rua se tornou. As pessoas que ele
matou e o quão selvagem e brutal ele pode ser quando perde o controle.
O que você ia dizer se soubesse, em
coroa?, ele pensa consigo mesmo, o que diria se soubesse das merdas que seu filho
anda fazendo?
Uma
lágrima desce dos olhos do lobo, do garoto, do Andy Valentine, o ladrão que se
mudou para Bleak Hill e lá encontrou uma nova família.
Nem
é por mim, é por ela. Por eles.
Após
algum tempo, ele sente que o cheiro ficou fraco...e nota que a caminhonete
curvou, mas que o cheiro prossegue para sua cidade. Ele pula do veículo, e
volta ao rastro.
Só mais um pouco, Hello Kitty. Aguenta só
mais uns minutos que eu já acho você.
[...]
Mandy
desperta, sentindo dor na nuca. Quando abre os olhos, se assusta com o fato de
estar nua, acorrentada na parede e em um lugar escuro. Ela tenta se soltar, mas
logo percebe que é inútil. Se lembra então do último ato do Golem, e grita de
revolta. Ela era uma refém na igreja, achou que foi salva, e agora... lá está
ela de novo com correntes nos pulsos, e de prata.
— Dormiu
bem, flor? — Jeanne pergunta, alertada pelo som das correntes. — Ele foi mau
com você também?
Mandy
se assusta ao perceber que tem mais alguém ali. Principalmente depois que
percebe o cheiro dessa pessoa.
—
Você é vampira, certo? — A garota pergunta para sua amiga das sombras, aos
poucos seus olhos se adaptando. — Foi mesmo o Golem quem fez isso?
—
Golem, Paul Davis... um lunático. Acho que ele quer montar um circo, e nós
somos as felizardas. — Jeanne sorri, deixando transparecer um pouco do quanto
está abatida.
Mandy
fica em silêncio. Conforme sua vista se acostuma, consegue ver um pouco dos
ferimentos da vampira. Ela não deixa de notar o quanto a mulher está magra e
fraca, com marcas em muitas partes do corpo...e isso apenas no que ela consegue
discernir. Uma vontade enorme de chorar começa a dominar a garota...mas ela
resiste! Ela é uma loba, não é? Não é uma patricinha qualquer, é uma guerreira!
Não importa a situação, ela vai encontrar um jeito de sair dessa. É isso o que
ela pensa, enquanto trava sua luta interior.
— Eu
vou sair daqui, tia. — Ela diz, confiante. — Isso é uma promessa.
Jeanne
apenas observa a garota, cética. Ela mesma já perdeu a esperança de escapar de
lá. Gostaria de acreditar, assim como ela. Tornaria mais fácil suportar sua
nova realidade. Ela é uma vampira ainda jovem, não chegou sequer aos cem anos.
Mas mesmo enquanto ainda era humana, já era mais velha e experiente que a
garota a sua frente. Uma menina tão nova, e que já teve que lidar com o
sobrenatural rotineiramente. Uma licantropo irmã de outro, isso com certeza
marcou a garota. É com esse pensamento que a vampira fecha os olhos, não sente
necessidade de sono antes do amanhecer, mas não há muito mais o que fazer, e ela
procura sempre poupar suas forças.
É com
surpresa que ela ouve o som da porta do porão se abrindo. Muito maior a
surpresa, quando percebe que quem desce as escadas não é o professor, mas sim
um garoto, vestindo apenas uma calça. Andy farejou até a casa. No caminho,
roubou uma calça em um varal vizinho e improvisou um pedaço de arame para
destrancar a fechadura. Havia um cachorro, mais curioso por ele que qualquer
outra coisa. Não foi difícil impor sua presença animalesca para o animal, que
se encolheu em um canto, chorando baixo. Ele esperava encontrar um covil
secreto, uma fortaleza bem guardada. Ao invés disso, encontrou uma casa padrão
da cidade, do tipo que ele poderia ter invadido a qualquer momento no período
em que roubava por lá.
Uma
vez dentro da casa, ainda seguindo os cheiros, ele percebe que eles prosseguem
para um possível porão. O cheiro do Golem pode ser sentido até um quarto
fechado, de onde se ouve música hebraica em volume alto. Parte dele quer ir
atrás do tal sujeito e descobrir o motivo dele não ter levado a Mandy para a
família, mas a prioridade é resgatá-la.
— Ei,
Hello Kitty. — Ele sussurra pra ela, parando perto do seu rosto. — O príncipe
chegou.
A
garota é tomada por uma grande alegria, transparecendo em seu sorriso. Não só
por ser o Andy ali para salvá-la, mas principalmente por ser uma prova de que
ele não morreu.
— Que
merda de príncipe eu fui arrumar, hein? — Ela brinca, enquanto uma lágrima de
felicidade escorre pela face.
Após
jogar um sobretudo empoeirado sobre o corpo nu da menina, e queimar as mãos nas
correntes de prata quando tenta puxá-las, ele percebe que a transformação é
inevitável. Ele assume sua forma bestial novamente, resultando em um monstro de
mais de dois metros de altura, músculos impressionantes, presas afiadas, olhos
vermelhos e pelo branco.
— Vai
ter que ser na marra, então. — Andy fala, enquanto forra as mãos com tiras de
pano, e agarra com força as correntes presas.
Jeanne
assiste o lobo arrancar ambas as correntes da parede, um processo não só
violento, como barulhento também.
— Ele
com certeza ouviu isso. — Jeanne diz para a Mandy, ciente que o lobo a está
ignorando de propósito. — Ele tem armas de prata e é perigoso. Mas juntos,
podemos cuidar dele fácil.
Andy
dá um largo sorriso de zombaria ao olhar para a frágil vampira.
— Meu
problema é só ela, você que se dane!
Ele
então sente sua orelha sendo puxada com força, dando de cara com uma Mandy
Duncan que o encara como de costume.
—
Nada disso, Scooby. Não importa se ela é vampira, não vou deixar o maldito
brincar com ela. — Ela então aponta na direção das correntes. — Ajude-a!
Ele
rosna em desaprovação, Jeanne e Mandy sorriem.
Paul
já bebeu bem mais de uma garrafa quando ouve o som de algo sendo quebrado em
sua casa. Ele se ergue com dificuldade, pisando em cacos de vidro de um porta-retratos
quebrado. Ele pega sua pistola em uma mão e sua espada na outra, enquanto sai
de um quarto fechado e com música alta. Não coloca máscara ou uniforme...não há
tempo para isso.
Ele
fica realmente muito surpreso quando se depara com a porta do seu porão aberta,
e ouve o som de alguém passando pela porta da frente. Paul corre, ainda a tempo
de vislumbrar o grande licantropo branco em seu quintal, levando uma garota nos
braços: Mandy Duncan. Paul dispara na direção dele, um dos tiros atingindo a
perna do lobo, que interrompe sua fuga para encará-lo com olhar assassino e
dentes expostos. No quarto tiro a munição acaba, e ele abaixa a arma, enquanto
coloca a lâmina apontada para o adversário, em desafio. Está fraco, ferido, sem
armadura ou munição. Mas ele tem seu orgulho...isso aliado a um certo desejo de
morte.
O
pelo do lobo se eriça, puro desejo de destroçá-lo.
— Andy, não! —A
voz da Mandy o traz de volta a si, e ele se lembra do que realmente importa: a
segurança dela.
Em um
instante o lobo branco salta sobre o muro da casa, logo saindo da vista do
Golem, enquanto avança pelos terrenos vizinhos. Paul olha para aquilo sem
reação, assistindo sua única vitória naquela noite ser tirada dele tão
facilmente. Ele entra na casa já entorpecido, não só pela bebida, como pela
frustração. Desce as escadas do porão apenas para constatar o que temia: Jeanne
Hillton sumiu.
Ele
se deixa cair no porão, sentado. Seus olhos fitando o nada, vermelhos de choro
e bebida.
— Vê,
Paul, no que dá brincar de Deus? — Pergunta a madre, novamente queimada. — Você
deveria matá-los, não brincar com eles. Exterminá-los, não fazer experiências!
Ele
não a encara, apenas continua catatônico.
—
Você perdeu tudo, cara. Você é um lixo. — Diz a voz de um antigo morto. — E sua
mulher, hein? Acho que ela prefere fuder com o Drácula!
Os
mortos riem, zombam. A música hebraica ainda sendo ouvida por ele. Paul leva as
mãos à cabeça, caído, desamparado.
—
Lamento por ter falhado, Paul. Mas prometo que não vou te deixar sozinho. — A
voz é do Roger, o ex-detetive. Paul contempla com pesar a face do pobre homem,
que exibe um buraco na lateral do crânio, de onde jorra sangue.
Ele
se arrasta até sua mesa de trabalho. Sob o som dos risos, das críticas, dos
sermões e das promessas. Ele abre a gaveta, retirando de lá duas coisas: uma
foto, dele junto da Kellen...de uma época feliz. E uma pistola, dessa vez
carregada.
— ...
o lobo sabe sobre mim agora. A garota também, e claro... a puta vampira. — Um
sorriso nervoso no rosto suado. — Minha vida aqui acabou.
Ele
sente os olhares sobre ele, a expectativa.
— ...
Kellen...
E do
lado de fora da casa, um tiro pode ser ouvido.
[...]
Próximo
ao hospital.
— Agora
você tá livre. — O garoto diz, após romper a última corrente que prendia a
menina.
— Você...
você não pode tá falando sério. — Ela diz, enquanto encara a face do grande
lobo. — Depois de tudo que você fez por mim, depois de tudo que a gente viveu lá
em casa.
Ele
desvia o olhar, sem jeito. Ela então o puxa pelo pescoço, apoiando seu rosto no
focinho dele. O garoto volta a forma humana, exibindo uma série de novas
cicatrizes e feridas não curadas pelo corpo nu. A jovem o olha com intensidade,
deixando cair o sobretudo que cobria seu corpo. Eles se abraçam, e se beijam
com desejo. Um beijo longo, cheio de vontade, esperanças e medos. Quando
terminam, é o Andy quem se afasta primeiro.
— E o
que eu digo pra o Jimmy? Ou pra Emma? — Ela pergunta, triste.
— Diz
que eu preciso de um tempo sozinho. Que eu fiz coisas que não me orgulho, mas
que faria de novo se precisasse. — Ele sorri pra ela, que fica corada pela
situação. — E diz que eu sei onde vocês moram, e que se precisarem, eu chego ai
em um pulo. Adeus, Hello Kitty.
Dito
isso, ele assume a forma de um pequeno lobo branco, para a surpresa dela.
—
Adeus, Scooby. — Ela diz, com um sorriso meigo no rosto.
[...]
Adam
chega ao seu castelo, sob uma chuva fria que molhou a ele e a uma Marie inconsciente.
Ele a coloca na cama, a mesma sobre a qual ela morreu trezentos anos atrás. O
pesar em seu olhar é grande, teme que tudo se repita, teme perde-las. Marie...
Claire.
—
Tenha fé, senhor Tepes. — Lincoln diz, após abraçá-lo forte. — O senhor é hoje
um homem melhor do que já foi, os céus hão de honrar isso!
Adam
tenta buscar conforto nessas palavras, mas é tarefa difícil. Ele apenas assiste
ao homem tratar os ferimentos dela, enquanto ele mesmo usa parte do sangue que
ainda mantêm no corpo ferido para fechar as feridas mais graves que ela exibe.
Ele se alimenta na casa, mas mesmo com acesso a sangue, há limites para aquilo que
se pode fazer. Seja pelo próprio corpo, seja pelo dela. E após um tempo que
pareceu eterno.
— ...
Adam? — Ela sussurra, recobrando a consciência.
Ele,
que estava todo o tempo ao lado dela, sorri ao ouvir sua voz.
—
Estou aqui, estou sempre aqui por você. — Responde ele.
—
Foi... maravilhoso estar com você novamente. Sentir você, lutar ao seu lado. —
Ela diz com dificuldade, sua mão na dele. — Parece que nosso tempo juntos é
sempre tão breve. O paraíso realmente não foi feito para durar.
Lágrimas
de sangue molham o rosto dele, enquanto ouve o som da chuva lá fora. Lincoln
não está no quarto, estando somente eles lá. Como naquela fatídica noite.
—
Você sabe o que posso fazer. — Ele diz, mostrando as presas. — Sabe que posso
transformá-la. Uma maldição, mas a única forma.
— E você
sabe como sou teimosa, não? — Ela sorri, beijando a mão dele. — E que apesar de
tudo, eu prefiro assim.
Ele
beija a face dela, suavemente, até chegar aos lábios.
— Não
me deixe de novo, Marie. Como, como posso prosseguir sem você?
A
respiração dela fica mais acelerada, sua mão aperta mais forte a dele.
— Uma
parte minha estará sempre com você, meu querido. Seja nessa vida ou na outra.
Pois eu te am...
A voz
dela cessa, e seus olhos se fecham.
Adam
cai de joelhos, toda dor do mundo sobre ele. As lágrimas rubras molham seu
rosto, ao mesmo tempo em que ele abraça o próprio corpo, como se buscasse
desesperadamente conforto. Ele permanece assim pelas horas seguintes, e assim
ele adormece, ao amanhecer. Cessada a luz do sol, seus olhos se abrem, no mesmo
instante trazendo toda dor de volta com eles. Ele está deitado sobre a cama,
provavelmente graças a Lincoln. Se entristece ao perceber que ela não está mais
lá, que o corpo dela foi levado.
Adam se
levanta, sem vontade alguma. Se pergunta brevemente sobre o que fará, o que
dirá a família da Claire. Quanto tempo após isso persistirá desperto...e se não
seria melhor no fim das contas encontrar seu fim pelo nascer do sol, forma mais
bela para um vampiro morrer. Enquanto está imerso por esses pensamentos, não
percebe a presença de outra pessoa ali.
— ...oi.
— Diz uma voz familiar.
Adam
olha confuso para a direção da sacada, de onde surge a pessoa que o aguardava.
— Eu
estava meio entediada já de te esperar acordar. Sabe, não estou acostumada a
namorar gente que acorda após as seis da noite. — É ela, Marie... Claire.
Viva,
com roupas limpas e radiante. Um sorriso no rosto e uma xícara de chá nas mãos.
Ele fica atordoado, por um momento cético sobre aquela visão.
— ...
é você? — Ele sussurra, timidamente.
Claire
se aproxima mais, parando a sua frente.
— Parece
que viu um fantasma. — Ela brinca, seu sorriso único e olhos profundos o
quebrando por completo.
Ele a
puxa para si, segurando seu rosto com olhos brilhando, admirando sua face como
se fosse a primeira vez.
—
Como pode ser. Você... Marie se foi...eu vi.
Ela
acaricia seu rosto, sente seu cheiro.
—
Sim, ela se foi. Marie Winnicott, sua antiga esposa, se foi para sempre. Ela me
disse isso, ao me trazer de volta — Dito isso, ela se afasta.
— Só
sobrou eu, Claire Winnicott. — Faz uma mesura exagerada ao estilo antigo. —
Espero que seja o bastante.
Ele sorri,
gargalha diante dela, a fazendo rir também, por ver esse lado dele.
—
Então, Claire Winnicott, o que acha de recomeçarmos? — Ele pergunta, estendendo
a mão para ela. — Me chamo Adam Tepes, senhor desse castelo, filho do Drácula e
irremediavelmente apaixonado por você.
—
Prazer, Adam. Sou Claire Winnicott, estudante de psicologia e patologicamente
apaixonada por um certo vampiro charmoso. — Ela diz, apertando a mão dele.
E eles
sorriem, se beijam e olham juntos para aquela linda lua no céu estrelado, iluminando
aos dois, e a cidade de Bleak Hill. Se sentindo enfim, felizes como nunca
pensaram que poderiam voltar a ser.
E
assim se encerra essa história, essa saga de amor, tragédia e morte. Essa saga inspirada em um jogo, esse Conto
de Amor e Sangue.
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